Heleu e o olhar cafeinado



http://www.google.com/imghp?hl=pt-BR

Hoje de manhã, tomando um café com meu irmão, comentei sobre uma reflexão que tenho amadurecido muito nesses últimos dias: "Arrependo-me muito mais das palavras pronunciadas que do silêncio". E entre um gole e outro de um "extra forte", afirmei: "Das palavras ditas eu até posso me arrepender; do meu silêncio, jamais". No tempo exato desta hipérbole frasal, ele apenas me olhou fixamente, até que decidiu também pelas palavras pronunciadas. Como sempre, em baixo e bom tom: "Fale mais com o olhar, meu irmão", disse ele.

Naquele momento, um sorriso maroto brotou no canto esquerdo dos meus lábios. Pensei sobre o dito e comunguei com meu irmão aquela afirmativa. Sequenciei o prazeroso bate-papo com a seguinte reflexão: "É, meu irmão, tenho feito isso. Os meus olhares têm sido textos proporcionais a cada assunto e até específico a cada ouvinte". Ele me disse algo por meio de um sorriso, que no momento não entendi. Sei apenas que ele não aceitou minha explanação travestida de justificativa. Joguei olhares laterais, percebidos por ele, e elogiamos o café. Típica fuga de conteúdo.

Acontece que não entendo mesmo o "não retorno" para meus olhares, falta-me propriedade para analisar as possíveis falhas de percurso. O prazeroso, todavia, foi ter encontrado respostas que há muito procurava. Meu irmão me olhou surpreso, como a me ensinar esse "jogo de íris". Absorto, continuei minha exposição verbal: "Eu tento falar com olhares..." Ele levantou brandamente o indicador direito, como a licenciar a sequência do papo e, em tom afirmativo, disse que era preciso acertar o alvo dos olhares. "Putz! Devo ter errado muitos alvos, sou estrábico!", disse. Não bastasse, "muitos dos seus desejados ouvintes também podem ser míopes", complementou ele.

Entre risos sonoros, aquele "momento café" encerrou por ali. Sem o som das nossas falas, porque apenas nossos olhares se falaram entre risos, cada olhar com a sua síndrome. No coletivo, os lábios cerrados se elevaram e formaram um sorriso "selfie". De duas coisas agora tenho certeza: se em "boca calada não entra mosca", em olhares residem cobras, lagartos, dragões...ou flores. Afinal, cada um tem o olhar que a própria alma emana. Quanto às palavras, elas apenas representam sintomas da ação desejada. Os gestos as precedem. Então, olhares são textos!


João D'Olyveira  

HELEU e a saudade, a distância, a ausência, a solidão



http://www.google.com/imghp?hl=pt-BR

Hoje refleti sobre “saudade, distância, ausência e solidão”, até onde essas palavras são sinônimas ou correspondem a ações completamente diferentes em relação à amizade e ao amor. Para John Dryden, por exemplo, “O amor calcula as horas por meses, e os dias por anos: e cada pequena ausência é uma eternidade”. Já segundo François La Rochefoucauld, a “distância é como os ventos: apaga as velas e acende as grandes fogueiras”. Para Thomas Merton, a “distância mais longa é aquela entre a cabeça e o coração”. 

Nesse emaranhado linguístico, sei que estou sentindo saudade em razão da distância e, consequentemente, da ausência da pessoa amada, o que me conflita entre ausência e solidão. Tento ignorar, dizer que "vai passar", mas não passa, porque não ignoro. Nesse processo de busca, minha cabeça rala e rola, machucando meu coração triplamente infartado. 

Então, lembro-me de Neruda, para quem "a saudade é solidão acompanhada. É quando o amor ainda não foi embora, mas o amado já". Completo-me confusamente com Sêneca, ao me lembrar de um dito pertencente a ele: "Sentir solidão não é estar só, é estar vazio". Entre encontros e desencontros, somente uma afirmação me parece racional neste momento, aquela que eu mesmo produzi: hoje a saudade bateu tanto, que não tive outra alternativa a não ser apanhar. 


O que me creditou, porém, foi a expressão de Fábio de Melo, ao “mensagiar” que, se pela força da distância nos ausentamos. Pela força que há na saudade voltaremos. Afinal, somente eu sei sobre a extensão dos meus desejos mais íntimos e o quanto eles são verdadeiros. Por esta razão, fiz contatos, para possíveis tatos. O silêncio, todavia, foi resposta derradeira. 

No apagar da tela, exaustos, os toques celulares esgotaram-se, passaram pelo outro e por mim. Entendi, no paralelo, que o agora sentido também iria passar, como tantos outros passaram. "Quintaneando", poeticamente contra, direi a quem me perguntar: "Eles passarão, eu passarinho". 


João D'Olyveira

HELEU e a mãe de leite


http://www.google.com/imghp?hl=pt-BR

O tempo me presenteou com um ser humano para além dos falsos amores urbanos. Abençoou-me com uma santinha por quem muito já orei, minha querida "mãe de leite". Negra que me ofertou leite branco, o qual me energizou e me cadastrou branco e negro neste mundo: fruto de uma negritude terna e eterna, porque verdadeiramente materna. À minha "mãe de leite" solicito proteção terrena, porque estou circundado por ilhas habitáveis e por humanos que me querem apenas coronel, a quem aproveito e peço para saírem da aba do meu chapéu. E por ser assim, melhor que se antecipem os "drinks" para o período vespertino, como no tradicional "chá das cinco". À noite, desejo mesmo a dignidade do álcool, que queima prazerosamente os nossos pecados. Desses "abeiros de plantão", livrai-me, o Mãe Querida! 

Quanto à minha " santa mãe de leite", um reencontro agradabilíssimo, que ativou meu arquivo familiar. Papai partiu na minha infância, nem sei se já reencarnou. Mamãe partiu há quase dez anos, trabalha em uma falange do amor, em outro espaço espiritual, mais perto do céu. Os outros e outros e outros, "abeiros" ou não, todos eles partem comigo cotidianamente. Afinal, cada dia sempre sempre será um dia a menos por aqui. Uns partem com autorização do Criador; outros forçam suas partidas, com êxtase ou sem êxtase, com fumaça ou pó, ou com maquinário específico, comprimido e sem ar. E há aqueles que partem em vida, porque apenas "vampirizam" relações. Não se modernizam assaltando bancos de sangue, sugam energias. Sei que esses podem ganhar mil vidas...dos outros.  

E nessa minha vida que se fez coletiva, minha "mãe de leite" também me ofereceu a oportunidade de amar. Ah, esses amores, que nos enlaçam nas tormentas das paixões! O fato me remete à seguinte dúvida: onde termina a tal paixão e começa o tal amor que tanto nos importunam? Na tenuidade deste questionamento, o que mais me interessa agora, contudo, é saber que minha outra "mãezinha" está "vivinha da silva". Encontrá-la, quando a achava também já partida e "falangeando" por aí, foi o meu melhor presente neste presente.  E por assim ser, tratarei de estar com ela o mais imediato possível. Nas graças de NSJC, abençoe-me, "mãezinha", e me proteja daqueles que enganam por meio de atos, palavras e omissões!


                                                                             João D'Olyveira

DESTAQUES DO MÊS